terça-feira, 24 de junho de 2014

Visitação à Dap – maio de 2014: FRUIÇÃO COMO EXPERIÊNCIA FORMATIVA

notas de observação sobre experiências de fruição com alunos do ensino básico  



Nas Diretrizes Curriculares, somos orientados a organizar os conteúdos relacionando-os com a realidade do aluno e de seu entorno. Ou seja, a partir de seus referenciais culturais. Mas quais seriam esses referenciais culturais?
As orientações ao se referirem a uma arte regional, ignora que os referenciais artísticos mais próximos da maioria dessas crianças e jovens são os globais, amplamente veiculados pela indústria cultural.
Tais impasses na organização dos conteúdos colocam em relevo uma das bases do ensino de Arte que muitas vezes é negligenciada: a fruição.
No ensino de Arte na educação básica, pelo menos três pilares sustentam uma boa compreensão de dinâmica de apropriação das linguagens e seus códigos. São eles contextualização, a produção e a fruição. Geralmente nos atentamos (muitas vezes devido às condições de trabalho, formação e interesse) as duas primeiras, que são fundamentais para o desenvolvimento dos conteúdos. Entretanto, a fruição como elemento formativo favorece o amadurecimento das duas primeiras.
Estar diante do próprio objeto de arte, é ter materializado diante de si, problemas abstratos, muitas vezes distantes e irrelevantes para o aluno. A presença física do objeto (ou como queiram: obra), força o indivíduo, pela violência de sua presença, a criar ferramentas de apropriação. A estabelecer relações. É uma forma de contato de inteligibilidades.





Foi isso que vivenciei como professor-público (me senti quase um voyeur) durante o mês de maio, acompanhando turmas do ensino médio e sextos anos em visitação à Dap – Divisão de Artes Plásticas da UEL. Durante duas semanas, observei as mais variadas formas de apropriação, da repulsa a um interesse inexplicável por determinados trabalhos. Pude notar a importância do tempo livre para a construção do saber. Um tempo livre direcionado, em um espaço que toda ociosidade direciona a um novo contato, a uma dúvida.




Nestas visitas ficou evidente, ao menos em minhas observações que o contato com o espaço se estabelecia em três estágios, nem sempre harmônicos, mas sempre presentes: a observação do espaço como uma busca curiosa das informações visuais ali dispostas;  a mediação, o momento mais tenso do processo, pois é o trazer o aluno a uma certa ordem de raciocínio que exige dele a organização das informações recolhidas no primeiro contato. A exposição do contato com o objeto de arte momento que ocorre ainda na mediação, mas que se estende ao espaço escolar na forma de dúvidas e associações. Associações estabelecidas dentro do espaço expositivo, instigadas pela mediação que cumpre o seu papel de não dar respostas de nada, mas sim construir possibilidades, de relacionar conhecimentos, e tornar próximos os conhecimentos em contato.  






Durante minhas permanências junto aos grupos que se formavam junto aos trabalhos, ouvi os mais diversos comentários:

Nosso! Isso é arte? Então eu também faço arte.
O que que é isso professor?
Que lindo! Adoro gatos. Mas o que ela quer dizer com essas palavras?
Porque que um cara junta fotografias na rua?
Eu não entendi isso.






Diante de tantas dúvidas, minhas respostas se mantinham quase que mecânicas: Leu a legenda? Observe a imagem e guarde bem a sua dúvida para o momento de debate. Entre os jovens de ensino médio, essas perguntas eram frequentes, havia certa curiosidade no ar que se limitava a procurar a resposta mais rápida e prática possível: o professor.




Com as crianças de sexto ano, a experiência ganhou outra dimensão, as mesmas procuravam construir suas relações, associações espontâneas:

É uma ABC de marca.
Esse macaco está empalhado. Porque que o artista desenhou o macaco morto?
É um monte de casinha. Que nem um robô.
Essas e outras observações mais construíam respostas que indagações. Memórias afetivas afloraram durante a mediação, não faltaram exemplos para relacionar aquilo que estava sendo exposto e os diversos contextos trazidos pelas crianças.
Dentre tudo que se disse sobre as apropriações do espaço, talvez o olhar mediado, seja o que mais me despertou a atenção.       Indiferente da idade, todos viam, se relacionavam com os trabalhos expostos, mediados por seus aparelhos celulares e suas câmeras. O olhar em boa parte do contato, foi filtrado por um monitor.


Esse período de visitação à Dap correspondeu à formação dos alunos que vivenciaram tal experiência, ao desenvolvimento concreto de um conhecimento estético significativo, diretamente relacionado à apreensão do objeto artístico e a seus estímulos sensíveis e cognitivos.


Um comentário:

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    Professor André Camargo Lopes.

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